Por
volta dos 6 anos de idade, em casa dos meus avós, cada vez que havia matança
era chamado para segurar na faca e matar o porco. Fazia as honras daquele gesto
fatal para o porco.
Tão novo, não tinha destreza nas mãos para guiar a faca.
Então, metia a minha mão sobre a mão de um homem, mais velho, e o bicho morria.
Não
me incomodava aquele cenário. Sabia que depois ia ajudar a desmanchar o
porco, normalmente tarefa reservada aos homens, e depois ajudar as
mulheres.
Eram
dias de festa! Dias especiais em que a família se reunia.
Ficava
impressionado com a força dos homens. O porco era para mim naquela altura, tão
pequeno fisicamente, uma verdadeira besta. Observava a enorme faca, sempre muito
bem afiada, cortar as entranhas do animal. A pele escondia grossas
camadas de banha, muito branquinha, como se queria.
Ouvia
os mais velhos contarem histórias de outras matanças já passadas. O recorde
de peso de porcos abatidos, as melhores carnes fazendo sempre referencia ao
criador, etc...
A
minha avó, sempre com a sua voz de menina (doce), lá estava. Sentada à minha
espera na ribeira para o acto mais solene: lavar as tripas. Relatava,
passo a passo, o que estava a fazer ensinando-me. E ainda hoje parece que a oiço:
-
Dobra a tripa e toma cuidado que a água está muito fria. Com um pauzinho
prendes a ponta da tripa e depois dás-lhe a volta e tornas a lavar. - Corta as
laranjas e esfrega-as muito bem nas tripas.
E
fazia aquilo tudo com o aroma da tripa, insuportável para alguns. Ali
ficava eu, sempre muito concentrado e entretido. Mangas arregaçadas, de joelhos
junto à ribeira, sempre com as mãos geladas. Eram dias de Janeiro ou Fevereiro . Dias bons de geada que ajudavam no sabor dos enchidos em fumeiro.
Já
em casa, na cave das matanças, temperavam-se as carnes e com o dedo provavam-se (com
o chup! do dedo mindinho
calculavam-se temperos - genial!), salgavam-se os toucinhos e os ossos,
faziam-se as banhas de pingo, as brancas e os torresmos...
Eram 3 dias de muito trabalho. E o emaranhado de cheiros era realmente
fantástico.
Eu
tinha uns avós que me faziam ser importante. Pensava…! Se não fosse pela minha ajuda
aquele porco nunca poderia ser morto.
Hoje.
Hoje a morte de um porco, pato ou galinha, faz-me muita impressão.
Talvez por ter consciência do sofrimento humano. Talvez! Sensibilizado com o
abate de um animal, a escolha das carnes que cozinho, é feita, não pela vontade
do estômago, mas pelo raciocínio. Depois, gosto de arranjar as carnes.
Banhas, torresmos e até boleimas. É assim que tudo começa.
Escolha um porco gordo que ande solto pelo campo e se alimente de bolotas.
Mate o porco.
Depois de aberto tire-lhe as tripas.
Escolha um porco gordo que ande solto pelo campo e se alimente de bolotas.
Mate o porco.
Depois de aberto tire-lhe as tripas.
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